Começamos pelo novo filme de Alexander Payne "The Descendants", com um texto que tive o enorme gosto de ver publicado no blog do programa Cinemax da Antena 1.
Em "The Descendants", Alexander Payne finalmente
abandona a imagem nuclear que povoa a sua filmografia mais recente do
homem solitário, de meia idade, em luta contra si mesmo e o mundo em
geral (personificado por Jack Nicholson em “About Schmidt”,
Thomas Jane em “Hung” ou Paul Giamati no brilhante “Sideways”)
e centra-se na única hipótese de redenção que a vida poderá
oferecer a um destes espécimes: a família.
O inteligente título
remete-nos para o âmago de todo o argumento (brilhantemente adaptado
do livro homónimo de Kaui Hart Hemmings): o legado deixado às
gerações futuras e a importância que este assume tanto para os
progenitores (a influência no futuro, as responsabilidades e as
mudanças que cuidar de uma vida em formação acarreta) como para os
"descendentes", sejam eles os filhos (para os quais o
legado é espiritual, ético, sentimental) ou os herdeiros (quando
após a morte, o legado é meramente material).
O legado é materializado
por um terreno de valor elevado que há gerações pertence à
familia de Matt King (Clooney), e que este se vê forçado a vender,
momento que sempre evitou e modificaria radicalmente a sua vida
e a de todos em torno de si.
Toda esta situação é a
perfeita e irónica metáfora da sua vida familiar.
A história é-nos entregue
"in media res" e o narrador omnipresente (o próprio Matt)
encarrega-se de nos ir inteirando de que sucedeu anteriormente e de
como a realidade em constante mutação influi no seu modo de vida.
Obssessivamente dedicado à
sua profissão, Matt negligencia as filhas e afasta-se da esposa, até
que o infortúnio atinge a família e o deixa a braços com a difícil
tarefa de resgatar o tempo perdido e o seu papel de pai.
Confrontado com a tarefa
hercúlea de ser referência e apoio para a família e
simultaneamente encarar os seus próprios medos e frustrações,
reconquistar o carinho e confiança das filhas torna-se a sua missão.
Payne transforma num
clássico o que outras mãos mais incautas deformariam em mais um
“filme-pipoca” de matiné dominical.
A realização, a montagem,
a atenção ao detalhe sem que se perca o fluir das cenas e do
argumento, conferem ao filme uma naturalidade e verosimilhança
inigualáveis no cinema actual.
A excelente direcção de
actores, combinada com a forma simples e objectiva com que temáticas
transversais como o amor e a perda são abordadas, deixam todo o
destaque ao texto e aos intérpretes, que naturalmente se superam e
nos inspiram.
A empatia entre as
personagens e o público torna-se inevitável, principalmente com
George Clooney que, finalmente despido da sua imagem de galã
conquistador, agarra o papel da sua vida, conferindo-lhe uma
sinceridade e transparência desarmantes e até comoventes.
Num ano em que Hollywood
claramente apostou na tecnologia e em sequelas mais do que forçadas
em deterimento de uma boa história, um filme desta qualidade e
simplicidade é uma lufada de ar de fresco que nos deixa uma ténue
réstea de esperança no futuro.
Esperemos que a Academia
honre o seu papel e premeie a audácia de Payne e Clooney.

3 comentários:
Deixa-me ver o filme primeiro e já posso ler este artigo até ao fim!
beijos e parabéns
m.
Podes ler à vontade que não tem spoilers :) tive esse cuidado.
o 1º comentário do blog :)
Finalmente :)
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