10 junho 2016

NOS Primavera Sound - Dia 1


No dia de abertura do NOS Primavera Sound, o Porto brindou os festivaleiros com o seu melhor e mais característico cartão de visita: a “morrinha”, aquela precipitação mínima porém persistente, que sem molhar muito, também não deixa nada nem ninguém completamente seco.
O recinto, invulgarmente cheio para um primeiro dia, numa 5ª feira, em que o cartaz não era especialmente apelativo, talvez tenha no feriado nacional do dia seguinte a explicação para a gigante mole humana que ocorreu ao Parque da Cidade. Ou há mesmo uma massiva base de fãs de Sigur Rós por aqui, de que eu não tenha conhecimento.
Considerações à parte, é já oficial que foi o dia de abertura mais concorrido da curta história do festival portuense.
A banda islandesa foi a protagonista do noite, para fãs e não-fãs (grupo no qual este vosso escriba se inclui). Esperançado numa actuação deslumbrante, que me fizesse esquecer a estridência da voz de Jón Þór Birgisson ou a dolência arrastada das músicas do seu repertório, apresentei-me como um bravo em frente ao palco para a prova dos nove. E não é que me surpreendi?
O repertório foi diverso, percorrendo toda a sua carreira de quase duas décadas. Não me peçam para soletrar letras ou identificar com rigor as músicas, porque a linguagem por eles inventada, somada à minha ignorância da mesma e de outros assuntos relacionados, tratar impossível tal desiderato.
As projecções que serviram de cenário ao espectáculo eram fantásticas, contríbuindo para a criação de uma ambiência verdadeiramente imersiva e envolvente. As imagens, compostas sobre a imagem real dos músicos, emulavam a sua dissolução em partículas mínimas que voavam com o vento, talvez em direcção ao público que não arredava pé e bebia cada palavra e acorde. Fiquei fã? Ainda não, mas com vontade de (re)descobrir o que me possa ter escapado na sua discografia.



Depois de ainda acompanhar o final do alinhamento dos Wild Nothing no Palco Super Bock, com a sua sonoridade a dever tanto a The Cure e seus sucedâneos, esperavam-me os Deerhunter no palco principal.
Para variar das suas aparições públicas mais recentes, foi um concerto impecável, quer no alinhamento quer no som cuidado que vinha do palco.
Bradford Cox, extremamente bem disposto e comunicativo, foi a mascote do grupo, juntamente com um peluche de uma cabrinha que fez as delícias do público e depois compareceu religiosamente nos restantes concertos do dia. Cabrinha a mascote do NOS Primavera Sound já!
“Coronado” não constou do alinhamento, mas Halcyon Digest esteve bem representado com as excelentes “Revival”, “Helicopter” e em especial “Desire Lines”, a penúltima do alinhamento e um dos grandes momentos de ontem, rivalizando apenas com a excelente “Cover Me (Slowly)”, interpretada com toda a distorção e piscadelas de olhos ao shoegaze possíveis, sacando novo trunfo numa bela mão, que foram jogando com toda a calma do Mundo.
Fecharam a actuação com uma excelente versão de “Snakeskin”, do mais recente Fading Frontier (4AD, 2015), deixando a pairar a sensação de que um encore caía mesmo bem.



Julia Holter nas teclas, acompanhada de bateria, violino e contrabaixo, deixou uma boa impressão no Palco Super Bock. O álbum Have You In My Wilderness (Domino, 2015), feito de momentos de pura beleza e sensibilidade, ficou demasiado aquém para o palco de um festival com a dimensão do NOS Primavera, servindo musak para o convívio animado que lotava o espaço diante do palco, entre passas apressadas, regadas a Super Bock e bocas sobre tudo e sobre nada. Um espaço mais intimista e controlado fará as delícias de qualquer amante de boa música.

O melhor da noite chegou com o início do dia da Pátria.
Os texanos Parquet Courts, com o seu rock pincelado de punk e da melhor safra das últimas décadas nesta área, teve o público na mão durante todos os segundo da sua intensa actuação.
Já ia avisado, mas confirmar in loco faz toda a diferença.
Pensem nums Queens of the Stone Age sob o efeito de um Xanax, num Joe Strummer com a cabeça (ainda mais) umas décadas à frente, num Sid Vicious sem tendências suicidas ou num Lou Reed que soubesse efectivamente tocar guitarra e talvez tenham uma ideia aproximada da sua sonoridade. E daí talvez não.
Não se via vivalma quieta e silenciosa, mesmo nas músicas aparentemente mais calmas como “Berlin Got Blurry” do mais recente Human Performance (Rough Trade, 2016), o centro de todo o alinhamento. Tudo soava estranhamente novo e familiar, por vezes na mesma música, o que a juntar a um desempenho sem falhas e pleno de electricidade quase palpável, foi receita certeira para tomar todos de assalto.



Os alucinatórios Animal Collective vieram com desenhos chanfrados, totems estranhos e projecções com todo os espectro de cores disponível à retian humana, para mostrarem que Painting With é perfeito para ser reproduzido em grandes espaços abertos, comunitário e unificador, como tão raramente hoje a música do género mais electrónico é capaz (EDM não é electrónica na minha cabeça...). “Floridada” foi a perfeita estocada final para uma tourada sónica épica servida pelo trio americano, aqui acompanhado por uma bateria.

A noite seguiu para o Palco Pitchfork, onde se esgotaram as forças que ainda restavam, com Red Axes e John Talabot e sus muchachos.

Até amanhã.

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